Foto de Doutora Carolina Maria de Jesus
Nos idos de 1958 na favela do Canindé
Às margens do rio Tietê
Fonte da foto: Folha Uol
Seguem palavras dela, em "Meu estranho diário"
"O livro me fascina
Eu fui criada no mundo sem orientação materna
Mas os livros guiaram os meus pensamentos
Evitando os abismos que encontramos na vida
Bendita as horas que passei lendo
Cheguei a conclusão que é o pobre quem deve ler
Porque o livro é a bussola que ha de orientar o homem no porvir"
Porque o livro é a bussola que ha de orientar o homem no porvir"
Carolina, que conheci em um anúncio na Revista Caras ontem, enquanto esperava no salão, fato que reforça que sempre há cultura e beleza a nos espreitar, uma escritora que tive a honra de conhecer no dia de seu nascimento, que foi em 14 de março de 1914, a cem anos atrás e no mesmo dia em que nasceu Castro Alves, no dia da poesia.
Nasceu em Sacramento, lá nas Minas Gerais, trabalhou ainda menina como lavradora, estudou apenas dois anos no Colégio Allan Kardec, primeiro Colégio Espírita do Brasil e aos 16 anos migrou para São Paulo, trabalhou como doméstica, como catadora de papel e sucata e em 1958, o jornalista Audálio Dantas, numa reportagem sobre a inauguração de um playground no Canindé, favela onde ela morava, se interessou pelos seus 35 cadernos de anotações em forma de diário.
E o admirado Audálio, teve a audácia de publicar um artigo sobre os cadernos de Carolina e em 1959, trabalhando na revista O Cruzeiro, divulgou trechos dos escritos na revista, já apostando numa publicação que reuniria esses relatos, que veio a se chamar: Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada, lançado em 1960, com notável sucesso editorial e seu nome, sua história e referência literária, como muitos tem o descaso da mídia, dos livros, a falta de reconhecimento e celebração.
A obra, segundo pesquisei foi um best seller na época, traduzida para vários idiomas. Uma mulher favelada, negra, de pouca instrução, a cem anos atrás, foi a primeira escritora a revelar os costumes, mazelas e identidade da favela e com todas as dificuldades que teve e discriminações que sofreu, conseguiu através de seus diários, romance e poesia dar um testemunho poético, social, político e cultural, exemplar de cidadania e de falta de fronteiras da escrita e da sabedoria. Apareceu na tv, deu entrevistas, ganhou prêmios, deixou a favela, recebeu até as chaves da cidade, mas seus próximos livros não tiveram a mesma repercussão do primeiro e logo foi esquecida. Já não era favelada, mas morreu na favela, no barraco de um de seus filhos, fez história. Palmas minhas para ela e minha pequena janela para lhe saudar e fazer conhecer e reconhecer.