Uma garrafa de pimenta pelo meio
Um latido e um céu limpidíssimo com recém-feitas estrelas"
Poetizou Adélia Prado
Leiteira de alumínio velha e cheia de vincos
Cronicalizou Ana PaulaAmaral
Assadeiras de pão, canecas, copos, pratos, travessas
Temos todos nós a nos espiar
Se paramos para olhar
Na casa de nossos avós, pais, tios
Que não se substituam pelas novidades
E com elas façam pareja
Água fervendo e leite na panela
Por aqui seguem, não gosto de microondas
Pelas ondas, pela falta de cheiro, barulhinho de ferver
Pelo gosto que não é igual
Além de que leite fervido na panela faz nata boa
Que em cima do biscoito Cream cracker
Com açúcar salpicada, a mim alegria faz sorrir
E botar água para ferver, para arroz, café ou ovo
Me faz lembrar que se a panela a gente se põe a olhar
Parece que a danada dana a nos pirraçar
Mas se dela agente se afastar, em minutos ela se põe a evaporar
A pouco ouvi e também lembro de Fernanda Montenegro
E sua fala em Um doce de mãe
Ela põe a panela no fogão e sai para comprar umas coisas
A porta fica aberta e o porteiro entra e desliga
Dando bronca nela que retruca chateada:
- Mas seu fulano, minha ambrosia perdeu o ponto por sua causa
Ele retruca falando do perigo dela ter saído e deixado o fogo acesso
E ela dispara:
- Fogo lá sabe que a gente tá em casa
Para fechar a proza de panelas, permanências e reminiscências
Que alimentam e resistem nos seu lugares e em seus ofícios
Nem que seja o de recordar
O restinho da poesia de Adélia, feito doce de panela
"A vida é mais tempo alegre do que triste, melhor é ser"